A
médica Carla Gapski, 38 anos, de São José dos Pinhais (PR), começou a
estranhar quando o filho Bernardo Gapski Schionato, ainda na pré-escola,
não queria ir para a aula, queixando-se de não aprender nada. A mãe,
então, procurou o Instituto para Otimização da Aprendizagem (Inodap), em
Curitiba (PR), onde descobriu a superdotação de Bernardo, hoje com sete
anos. "Como ninguém identificava as dificuldades dele, trocamos o
Bernardo de escola para um ambiente em que havia uma abertura maior. Na
nova escola, ele passou um ano tranquilo, em uma turma bastante
heterogênea, convivendo, inclusive, com dois colegas autistas. A escola
tenta trabalhar com as diferenças sem constranger os outros alunos",
relata.
Com uma grande facilidade em linguística e matemática, Bernardo já
cursa a quarta série do ensino fundamental, mas apresenta dificuldades
em áreas como a caligrafia. Por isso, Carla acredita que instituições
especializadas possam ser alternativas melhores, sentimento natural de
pais de superdotados, segundo a coordenadora do Inodap, Maria Lúcia
Sabatella. Contudo, ela afirma que segregar não é solução e alerta para
os benefícios de inserir esses alunos em ambientes heterogêneos. "As
escolas é que precisam estar preparadas para entender as crianças. Além
disso, a mistura entre alunos diferentes é muito saudável. Eles têm que
aprender a lidar com a diversidade. Claro que os pais achariam ótimo que
os filhos estudassem em escolas especializadas na superdotação. Mas
também é preciso pensar que, futuramente, essas crianças serão obrigadas
a enfrentar situações adversas", ressalta.
Maria Lúcia reconhece que falta preparo para professores lidarem com
alunos como o pequeno Bernardo. Faz coro à especialista a pedagoga Maria
Clara Sodré. Segundo ela, os professores brasileiros não recebem
nenhuma orientação específica durante a formação, tanto nos cursos de
pedagogia quanto nos de licenciatura. Para Maria Clara, a capacitação
deveria começar pelo básico: ensinar aos futuros professores o que é
superdotação, como identificá-la e o que a legislação garante para esses
estudantes especiais.
O Inodap, que passou à categoria de ONG em 2000, é especializado no
atendimento a superdotados desde 1993. A instituição realiza avaliação
para detectar a superdotação e dá acompanhamento para as crianças e seus
pais. Além disso, todos os profissionais passam por um período de três
meses de capacitação, nos quais participam de seminários e palestras
sobre o assunto e acompanham os processos de avaliação das crianças.
Eles, inclusive, são submetidos a testes de mapeamento cerebral para que
se identifique seus perfis de interação social.
A equipe também pode realizar visitas às escolas dos alunos que
frequentam o Inodap. Com a autorização dos pais, os profissionais
acompanham como vai a vida escolar do estudante, podendo fazer sugestões
de atividades para serem feitas em aula. Cada um desses processos de
acompanhamento varia de acordo com a adaptação das crianças dentro da
escola. Além disso, em alguns colégios, os profissionais do instituto
são chamados para fazer palestras sobre a superdotação.
"Mantemos uma longa conversa na primeira consulta e depois falamos
com os professores na escola da criança, além de orientarmos aos pais
das crianças pequenas e de adolescentes, com grupos de discussão de
textos. Muitas vezes, a superdotação é confundida com a hiperatividade. É
fácil que haja essa confusão, pois a conduta é parecida: tanto o
superdotado quanto o hiperativo são impacientes, mas o primeiro tem uma
facilidade maior de aprendizagem do que o segundo", esclarece.
Especializada
no trabalho com superdotados, Maria Clara promove no Instituto Lecca,
em convênio com a Secretaria de Educação do Rio de Janeiro, um programa
de acompanhamento a 24 crianças do terceiro ano do ensino fundamental de
escolas públicas da cidade nas quais é identificada a superdotação.
Essas crianças são selecionadas entre cerca de 3.500 jovens nas 50
escolas indicadas pela secretaria, a partir de uma série de testes de
raciocínio lógico, provas de conhecimentos em português, matemática e
redação, além de entrevistas, também com os pais. Após esse processo de
seleção, são escolhidas as mais aptas e com menor poder aquisitivo, que
passarão por um período de acompanhamento e preparação para ingressarem
em colégios públicos de excelência da cidade, como o D. Pedro II e o
Militar.
Durante dois anos, são feitas uma série de atividades que visam a
aumentar a capacidade de pensamento crítico e criativo das crianças,
além do desenvolvimento de uma cultura geral, a partir de visitas a
museus, exibição de filmes, debates de temas da atualidade e abordagem
mais lúdica de conteúdos de português e matemática. Após esse período,
os alunos realizam então o exame de admissão nas escolas. "O processo de
ensino é mais participativo: o aluno não é passivo em sua aprendizagem.
A nossa meta de aprovação entre este grupo é de, no mínimo, 80%, mas as
crianças costumam ultrapassar esse número", comemora a pedagoga.
Legislação garante programa de atenção diferenciado
Segundo Maria Clara, ainda há um desconhecimento por parte das instituições de ensino sobre a legislação referente aos superdotados. "Eles já têm direito a um programa de atenção diferenciado, com um currículo mais abrangente e atenção especial dentro e fora da escola, desde os anos 1970, mas as instituições de ensino desconhecem. A lei também permite que esse alunos possam pular de ano, mesmo que a criança tenha capacidade de aceleração apenas em uma matéria. Mas isso acontece de fato em pouquíssimas escolas brasileiras. Também há a tendência natural de ter dificuldade para lidar com a novidade, que faz com que os colégios neguem ter alunos superdotados", afirma, acrescentando que a legislação do país é bem avançada.
Segundo Maria Clara, ainda há um desconhecimento por parte das instituições de ensino sobre a legislação referente aos superdotados. "Eles já têm direito a um programa de atenção diferenciado, com um currículo mais abrangente e atenção especial dentro e fora da escola, desde os anos 1970, mas as instituições de ensino desconhecem. A lei também permite que esse alunos possam pular de ano, mesmo que a criança tenha capacidade de aceleração apenas em uma matéria. Mas isso acontece de fato em pouquíssimas escolas brasileiras. Também há a tendência natural de ter dificuldade para lidar com a novidade, que faz com que os colégios neguem ter alunos superdotados", afirma, acrescentando que a legislação do país é bem avançada.
Além dos testes, existem outras formas mais abrangentes para detectar
a superdotação. "Como o QI mede apenas a linguagem e o raciocínio,
outras seis áreas da inteligência não são levadas em conta. E a sua
função nem é essa, na verdade, então ele distorce bastante. O QI tem uma
razão clínica: foi criado para medir defasagens de conhecimento, não
para detectar casos de inteligência acima da média. Para identificar a
superdotação são usados uma série de testes informais, de uma forma mais
espontânea, mais focados nas capacidades verbais, com crianças
pequenas, por exemplo", afirma Maria Lúcia.
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